Da Periferia ao Centro em Segundos | COLUNA#2
- D IDEIA #aoseuredor
- 21 de nov. de 2018
- 2 min de leitura
Atualizado: 2 de jul. de 2019

Depois dos 30 eu passei a ter outra relação espacial com o tempo; é como se, ao contrário da impressão unânime de ser engolido por ele, houvesse algo nesse transcorrer que me alimentasse e engrandecesse. Hoje, como o tempo passar com os olhos à medida que ele testa a minha fome... Segundos passados fluem da periferia ao Centro Histórico da minha existência, escoam-me por vielas da retina e assentam-se no córtex aguardando o processo de tornarem-se centímetros... Aí vou remendando o futuro no passado e concebendo o presente às porções quilométricas que os olhos engolem.
A existência percebida ao olhar insiste em me convidar a passear pelas ruas da nostalgia; percursos da memória que, enquanto presentes, me lembram o presente “de trás pra frente” como se, prevendo o futuro ao contrário, vivesse a lembrança material do que ainda viria a acontecer.
Por outro lado, há o senso comum de uma sensação do presente se repetindo, como se aquela “lembrança do futuro” viesse à tona outra vez mas, nesse caso, como a previsão do passado.
A existência percebida olhos afora, misturada a essas intervenções sensoriais, visuais e internas, enquanto coexistem ali, numa fração mística dos 3 tempos – passado, presente e futuro; deslocados da fluidez natural do próprio tempo-corrente, é o que chamamos de DEJA VU, eu acho.
Vibrações provocadas no ar, codificadas em tons e percebidas como uma dimensão auxiliar do tempo: a MÚSICA! Elas tem o poder de arrancar do meu Eu, pensamentos meus que eu sequer sabia que pensava, se os pensava ou se as ouvia enquanto elas tocavam, enquanto eu as ouvia no ar. As músicas nunca perguntaram qual o meu humor, minha condição atual, se estou preparado ou não para o que venham sugerir. A música e-las-te-ce o tempo; tem o poder metamórfico de encurtá-lo ou expandi-lo ao torna-lo mais ameno, agradável, intenso ou sofrível um momento qualquer em sua companhia.
Mas os cheiros... Porra! Os cheiros tem o poder de ME arrancar, sem perguntar, e me levar direto ao lugar de onde vieram, d’onde os cheiros que outrora eu sequer sabia que cheirava, cheiravam à minha própria existência. É isso... Eu sinto que o tempo cheira. Eu sinto o cheiro do tempo... Aliás, o tempo e o cheiro são outro exemplo dessas coisas abstratas, intangíveis que de tão compreensíveis já não se explicam mais por si mesmas, mas servem uma pra explicar a outra.
Durmo, acordo e rastejo o corpo sólido entre ruas líquidas, afogado nesse futuro nostálgico e engolindo a magia confusa do que a fração infinita do tempo possa parecer.
Autora(o): Ana Ivatom
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